Do café commodities à marca própria de especiais
Como Renata Rigo herdou uma atividade tocada pelo pai e hoje amplia pontos de venda da marca própria, o Café da Rota
Um delicioso cafezinho, expresso ou coado, faz parte da recepção do showroom do Café da Rota, marca produzida na propriedade de Renata Vargas Rigo de Sousa. Localizada no Estreito, lá estão os galpões de armazenamento, a torrefadora, o escritório e toda estrutura necessária para o manejo, beneficiamento e empacotamento do café torrado, moído ou em grão.
Ser cercada pelos morros cultivados por café arábica dividindo espaço com remanescentes da mata atlântica não é o único charme da propriedade que faz divisa com a zona urbana de Conceição do Castelo. História familiar e a presença feminina no comando estão no DNA de um café que atualmente está disponível em mais de 280 pontos de venda na região, na Grande Vitória e em Cachoeiro de Itapemirim.
Além da história de sucesso, o projeto é uma inspiração para outras mulheres, principalmente as mais jovens que se veem diante da possibilidade de tocar as propriedades familiares.
Com Renata foi assim: a vida a colocou diante de um desafio num universo de predominância masculina. Ela iniciou na administração rural em 1987, ano que seu pai, Osvaldo de Mello Rigo, faleceu. Apesar da pouca experiência adquirida com seu pai, Renata foi herdeira de um visionário, que deixou um legado de trabalho, perseverança e seriedade, como ela mesmo descreve.
Na época Renata cursava faculdade de direito e se formou dois anos depois, em 1989. Ela decidiu então deixar a advocacia para se dedicar à administração rural e, desde então, trabalha no cultivo do café. “Na verdade, minha paixão pelo grão surgiu na infância, durante as visitas às propriedades junto com meu pai. Ele sempre cultivou café, além de comercializa-los, pois possuía comércio de compra e venda de café”.
Com a dupla linha de combate (produção e comércio), cada uma trazia múltiplos desafios, pois era uma época que poucas mulheres exerciam atividades culturalmente destinadas aos homens. “ Durantes muitos anos estive à frente da empresa, no comércio de compra e venda de Café. Negociar com uma mulher, principalmente em um ramo como o de café, era um tabu. Aos poucos foi sendo superado, em parte pelo nosso trabalho, mas também graças ao legado deixado pelo meu pai, que sempre mostrou muita seriedade e lisura na condução dos negócios”.
Renata se lembra de ser a única presença feminina nos cursos de capacitação oferecidos na época, até mesmo nas palestras relacionadas ao cultivo do café. “A participação das mulheres era restrita aos afazeres domésticos e, em alguns casos, atuava nas atividades cafeeiras no ambiente limitado à propriedade, junto com a família”.
Cafés especiais
Renata resolveu deixar um pouco de lado a cafeicultura tradicional e passou a buscar uma cafeicultura diferenciada. No ano 2003 começou a entrar na produção de cafés especiais, pois com as mudanças do mercado mundial, ela concluiu que era preciso buscar outro caminho para se manter na atividade, aprimorando o que já fazia. Naquele ano o seu café ficou entre os melhores do Brasil e participou do leilão internacional.
“Os concursos vieram como um grande estímulo. Quando ficamos entre os melhores no Cup off Excelence, a produção dos grãos de qualidade era ainda muito tímida”, disse sobre o motivo que a levou a estruturar melhor a propriedade para aumentar a produção de especiais.
Essa nova forma de lidar com o café: do plantio até o armazenamento demandou investimentos em terreiros, tulhas, maquinários e também em espe-cialização da mão de obra. Com a torrefação foram necessários novos investimentos e a propriedade se preparou para receber melhor os visitantes, já presentes no seu dia a dia.
Em 2010 Renata conquistou o segundo lugar no Concurso Estadual, além de várias outras premiações, que serviram de estímulo para ela acreditar no mercado e investir ainda mais na produção de cafés finos.
Renata já perdeu a conta de quantos prêmios já recebeu pela qualidade do café produzido em sua propriedade. O café dos plantios de Renata Vargas Rigo de Sousa já ficou entre os melhores do Brasil, foi segundo no Espírito Santo e primeiro nos concursos do município. Com as vitórias, seu café tem levado o nome de Conceição do Castelo como terra de produção de café de qualidade, fazendo valer a tradição cafeeira que predominou a economia durante décadas e que se renova diante da nova realidade da cafeicultura brasileira e mundial.
Novos desafios
Durante todos esses anos, Renata observa os vários desafios enfrentados, entre eles a oscilações do mercado, com preços muito baixos. “Era preciso contabilizar todos os custos, além de conter as despesas, senão as contas não fechavam. Foram períodos difíceis, mas acredito que as dificuldades nos ajudam a crescer. Nestes momentos, eu lembro de meu pai, que dizia que só ganha dinheiro quem persiste, referindo - se ao ramo de café”.
E o conselho do pai foi seguido à risca. “Sempre acreditamos na atividade. Durante esses anos aumentamos nossa produção de café, com plantio de áreas novas e substituição de talhões antigos. Investimos em tecnologias de plantio, manejo e colheita dos grãos”.
Marca própria
Em 2017, visando agregar mais valor à produção e colocar nas prateleiras dos supermercados os cafés de qualidade que produzia, a propriedade abriu uma torrefação. A marca Café da Rota surgiu em alusão à Rota Imperial, que passa próximo à entrada do Sítio Paraiso, na sede do município. A Rota foi aberta por D. Pedro ll, ligando Ouro Preto, em Minas Gerais, a Santa Leopoldina, no Espírito Santo, passando por 14 município capixabas, inclusive Conceição.
Atualmente a torrefação atende a toda região, com mais de 280 pontos de entrega, entre supermercados, cafeterias e empresas. Atende também alguns pontos em Vitória e Cachoeiro de Itapemirim.
São três linhas de café, todos 100% arábica: o Café da Rota tradicional e os especiais: o Rota Ouro e o Rota Gourmet. Este último com pontuações acima de 83, com uma colheita seletiva, só os grãos maduros, e com secagem em terreiros suspensos.
A linha gourmet é produzida com cafés da área mais alta da propriedade, nas áreas acima de 800 metros. São cafés frutados com sabor adocicado, extremamente saborosos. Também houve investimentos na torrefação em capacitação dos funcionários e em maquinários modernos, o que, na avaliação de Renata, facilitou a produção e propiciou a excelência dos grãos.
Com um showroom, a torrefação funciona de segunda a sexta-feira, das 7 às 17 horas. No espaço tematicamente decorado, os clientes são recebidos e podem saborear um delicioso cafezinho e têm a oportunidade de conhecer a história familiar na cultura de café naquela propriedade, bem como todo o processo de produção do Café da Rota.
Renata acompanha de perto todo processo de produção: o plantio das lavouras, manejo da colheita, beneficiamento e por último a industrialização. “Como dizia meu pai: 'o olho do dono que engorda o boi’, referindo -se a um ditado popular. Pura verdade! Sou muito feliz e realizada, agradeço a Deus pelas oportunidades que a vida me presenteou”. A produtora finaliza, registrando que o apoio da família sempre foi muito importante para o resultado colhido no presente.