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Mulheres e o desafio de um cargo de liderança

Mulheres e o desafio de um cargo de liderança

Data de Publicação: 28 de fevereiro de 2020 20:58:00 No rol das mulheres incríveis, a Revista Folha Nova abre espaço para Eliane Gomes Zandonadi e Tânia Uliana Torres, que exercem cargos de liderança no Sicoob Sul-Serrano. Exemplo de luta pelo espaço profissional, elas contam sua experiência e inspiram outras mulheres a conquistarem novos espaços na sociedade

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“A presença de mulheres é comum nos cargos de liderança nas cooperativas com as
quais convivemos e, talvez por isso, não nos causa estranheza e conseguimos nos sentir à vontade desempenhando nosso papel”.       

 

Eliane Com o esposo Renilto Antonio Zandonadi.
E com parte da prole: Danieli, Domenica e Douglas. Diogo
mora na Itália e ainda têm as netas Maria, Helena e Vitória.

Em 1995, quando fui convidada para trabalhar na cooperativa de crédito, que estava sendo criada em Venda Nova, havia acabado de sair de uma jornada de cinco anos em outra instituição financeira, através de um plano de demissão incentivada. Nesta experiência, apesar de concursada, não havia desempenhado nenhum papel relevante no banco e nem tive oportunidade de crescimento enquanto lá fiquei.

Aceitei o desafio da começar na cooperativa, motivada pela confiança que os dirigentes depositaram em mim e por conhecer a capacidade das pessoas que estavam liderando  o empreendimento. Naquela época, não imaginava os rumos que a cooperativa iria tomar ao longo do tempo.

Comecei como controller, em novembro de 1995. Era responsável pela contabilidade, pela área  administrativa e pelas pessoas. Contribuía na estruturação de novas agências e fui adquirindo conhecimentos e habilidades através das oportunidades de treinamento e pela própria necessidade de adaptar-se às exigências impostas pelo mercado, pelo órgão regulador, pelas mudanças operacionais internas  e pelo crescimento acentuado da cooperativa em toda a região.

Em pouco tempo, junto com a Tânia, passei a exercer cargos de relevância na cooperativa, principalmente pela confiança dos dirigentes no nosso trabalho. Desta forma, como as coisas foram acontecendo naturalmente, posso  dizer que nunca tive grandes dificuldades por estar num papel de liderança convivendo com muitos colaboradores (homens e mulheres), inclusive numa relação de subordinação.

Acho que o importante é saber respeitar os nossos limites e o limite do outro, como também dar-se ao respeito em nossa postura na rotina diária, em qualquer ambiente, independente da hierarquia, tão presente no mundo corporativo.

A presença de mulheres  é comum nos cargos de liderança nas cooperativas com as quais convivemos e talvez por isso, não nos causa estranheza e conseguimos nos sentir à vontade desempenhando nosso papel.

Em 2015 houve uma mudança muito relevante na estrutura administrativa da cooperativa, com a instituição da governança corporativa, pela qual foi criada a diretoria executiva, com segregação de papéis entre esta e o Conselho de Administração, seguindo determinação do Bacen para todas as cooperativas. Tânia e eu fomos eleitas pelo Conselho para ocupar esses cargos e assumir responsabilidades ainda maiores, pois passamos a responder diretamente pela execução dos objetivos traçados pelo Conselho na condução dos negócios.

Hoje, como diretora operacional e com o desenvolvimento alcançado pelo Sicoob, tenho uma grande responsabilidade para manter e continuar contribuindo para o crescimento sustentável desta grande cooperativa, zelando pelas pessoas (mais de 280 funcionários em 27 agências) e  pelos associados, que são a razão da nossa existência.

Tudo isso torna a rotina muito atribulada, onde é  preciso encontrar equilíbrio entre casa, trabalho, viagens, o que nem sempre é fácil. Porém, procuro organizar os horários para não deixar de fazer alguma atividade física, cuidar da aparência, participar de atividades na comunidade, dar atenção à família. Tenho quatro filhos, e, embora não estejam mais em casa, estão sempre comigo em minhas preocupações de mãe. Tenho também três netas, às quais eu gostaria de dedicar mais tempo. E, claro, tenho meu marido, companheiro excepcional, que muito me ajuda com sua  compreensão, nas minhas ausências ou quando o tempo que temos não é exatamente como gostaríamos que fosse.

Acredito que para conquistar e manter-se em posições de destaque no mundo corporativo, ainda predominantemente masculino, as mulheres tem que ter coragem para se posicionar, muitas vezes abrir mão de ficar mais tempo com a família e amigos, mas, não duvido nem por um segundo, que todas podem conseguir isso, desde que se preparem e não desanimem diante das dificuldades que sempre aparecem, maiores ou menores.

Eliane Gomes Zandonadi - diretora operacional do Sicoob Sul-Serrano

 

Iniciei minha trajetória em instituição financeira em 1985, quando da inauguração de um banco privado em Venda Nova. Nessa a experiência  de sete anos atuei em vários setores, desde caixa à chefe de serviços. O aprendizado foi de grande valia, pois tive a oportunidade de conhecer todo mecanismo de um grande agente financeiro, mesmo com a pouca tecnologia daquela época

 

 
 
Tânia com o esposo Jorge Torres. 

 E com os filhos e Thaís e Tiago.

 

Eu me desliguei em 1992, por não aceitar uma transferência a qual o banco me impunha. Em 1993 nasceu minha primeira filha, Thaís, quando me dediquei exclusivamente à maternidade e aos meus afazeres do lar.

Em 1995, recebi o convite para fazer parte da equipe que inauguraria uma Cooperativa de Crédito Rural em Venda Nova, algo muito novo para mim. Nesta época, minha filha tinha dois anos e meio e, em comum acordo com meu esposo, Jorge, e ciente do desafio que estava por vir, aceitei. 

Iniciei como caixa na agência da então Novacredi, no bairro de Vila Betânea. Junto com os demais colegas e dos Conselhos de Administração e Fiscal, iniciamos um trabalho que entraria para a história da região. A Cooperativa, comandada pelo presidente Cleto Venturim e pelo vice na época,  César Pereira Teixeira, dava os primeiros passos para divulgação e conscientização sobre o cooperativismo de crédito.

No início, além de trabalhar no caixa, comecei a atuar no crédito rural. À medida que a Cooperativa foi abrindo agencias em outros municípios, passei a trabalhar na retaguarda, na Unidade Administrativa. Ali era concentrada toda a parte operacional das agências e a contabilidade, onde fui supervisora de produtos e serviços e gerente de crédito. 

Em 1997, tive meu segundo filho,   Tiago. O esforço foi redobrado, para dar conta do papel de mãe e do trabalho. Sempre conciliei meus horários, para que eu pudesse levá-los aos compromissos além da escola, como ballet, futebol, catequese, aulas de inglês e ao Clube.

Em 2002, entrei para Faculdade, pois ainda não tinha curso superior, apenas técnico. Concluí minha graduação em administração de empresas em 2006 pela Faveni e, em 2009, minha primeira pós-graduação, na mesma faculdade, em gestão empresarial e finanças. Em 2017, concluí mais uma pós, MBA em gestão de negócios, pela Fucape Business School. Além disso, participei de intercâmbios com incentivo da Cooperativa para Áustria, França e Alemanha e também Canadá e Estados Unidos.

A partir de 2015, quando foi instituída a Governança Corporativa na Cooperativa, determinada pelo Banco Central do Brasil, fui eleita pelo Conselho de Administração como Diretora Executiva e Eliane Gomes Zandonadi, como diretora operacional. Foi um momento muito especial na minha carreira profissional. O Reconhecimento por parte dos dirigentes, cito aqui Cleto Venturim, que sempre atuou ativamente nos negócios da Cooperativa e que sempre valorizou e reconheceu o meu empenho e crescimento intelectual e profissional, para exercer tal cargo, assim como também o vice, Domingos Perim.

O desafio era enorme, porém, todo o preparo e formação acadêmica adequada me deram suporte para exercer o novo cargo, que exigiu um nível de liderança mais refinado, no sentido de lidar, compreender e auxiliar a minha equipe, composta por homens e mulheres, compreendendo gerente regional, gerentes de agência e supervises de produtos e serviços. Sempre contei com apoio e respeito de todos, sem qualquer tipo de discriminação, sendo que no Sicoob ES, os diretores executivos são todos homens.

O meu dia a dia é muito dinâmico, dividindo meu tempo da semana entre Venda Nova e Vitória, onde a Cooperativa tem atualmente 10 agências e demanda mais visitas e prospecções de novos negócios, além de viagens para treinamentos e Workshops.  Visito também as agências do interior, a cada semestre.

Há três anos decidi também estudar inglês, sempre pensando em estar mais capacitada para as experiências profissionais e pessoais também. Nos finais de semana, dedico meu tempo a minha família, aos meus pais que moram próximos de Venda Nova, à igreja, e é quando curto o meu hobby favorito: a culinária!

Com relação a evolução das mulheres no mercado do trabalho, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), menos de 14% das mulheres tinham emprego nos anos 1950, e o último censo (2010) mostra que esse número passou para 49,9%. Mesmo assim, a quantidade de mulheres empregadas ainda é bem menor quando comparada aos homens, cuja participação caiu. Passou de 80,8% em 1950 para 67,1% em 2010. Diante desses fatos, não se pode negar que houve um grande avanço, apesar da desigualdade em termos de salário e qualidade de emprego ainda estarem presentes.

Ainda que demore um tempo para superar todos os desafios da desigualdade, as mulheres vêm ganhando espaço no mercado de trabalho graças aos próprios esforços, onde a maioria das conquistas, principalmente por cargos de liderança, está ligado ao nível de qualificação. Portanto, deve haver investimento constante em educação continuada.

No Sicoob, 70% do quadro de funcionários são mulheres, várias exercendo a função de gerentes. Se estiverem preparadas, seguras do que querem exercer, as mulheres terão sempre seu lugar no mercado de trabalho, independente da empresa que atuam e poderão alçar voos cada vez mais altos.

Nesta minha trajetória profissional, aprendi algo muito importante que é a convivência com as pessoas. Não é o cargo que você ocupa ou seu gênero, que vai fazer com que as pessoas te respeitem mais ou menos, é a trajetória de respeito e admiração que você constrói ao longo da sua carreira, da sua vida! Cuidar dos relacionamentos, conectar-se com as pessoas, viver o momento presente, não deixar se levar tanto para o passado e futuro, é o que este mundo tão moderno e conectado de hoje nos pede.

Finalizo minhas considerações com uma frase que considero bem propícia ao que relatei acima, do psiquiatra e psicoterapeuta suíço, Carl G. Jung: “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”.

Tânia Uliana Torres - Diretora Executiva do Sicoob Sul-Serrano

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