Emílio Caliman - um arquiteto pé de vento
Subjetividade do processo criativo conciliada com as demandas e expectativas do cliente resulta em projetos únicos e icônicos
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Tal qual seu tio avô, padre Cleto Caliman, o arquiteto Emílio Caliman Terra gosta de viajar. Talvez mais pelo gosto das (auto) descobertas do que pela aventura em si. E, mesmo em territórios distantes, ele mantém o seu foco: leva o escritório na mochila e, com vista para o mar ou para as montanhas, ou até para o Rio São Francisco, se inspira e desenvolve seus projetos em conexão com sua equipe.
Quando é contratado para fazer um projeto, Emílio se põe a observar, com olhar atento, as pessoas que estão à sua frente e tem isso como seu ponto fundamental de partida para os trabalhos. "A pergunta é: qual história o cliente está trazendo, e como ajudaremos a contar este próximo capítulo da sua história. Após esta reflexão, seguem os fatores técnicos, tais como: qual o tipo de projeto, características do terreno, expectativa de gasto financeiro, qual as referências que a pessoa gosta, e assim por diante."
Dito isso dá para compreender que a arquitetura do Emílio vai além de portas, janelas e paredes. Ela vai acompanhada de um gosto especial pelos momentos que serão vividos ali naquela nova construção. “Eu busco informações e inspirações e devolvo como resposta 'projetual' através da arquitetura. Não me considero o dono da ideia e sim um agente que ajuda a ligação entre o ponto A (demanda do cliente) ao ponto B (obra construída). O caminho do diálogo e o empenho em oferecer aquilo em que acreditamos são a fórmula que tem nos levado a colher bons resultados”.
Ao enxergar cada indivíduo como único, Emílio não tem como falar de um padrão de projeto ou de um cliente. “Estamos sempre muito antenados ao perfil de quem nos contrata, sempre no exercício de nos colocar na estaca zero ao iniciar cada projeto”.
Outro ponto que Emílio gosta de destacar é a sua ligação com os clientes ser prioritariamente com o indivíduo que se coloca diante dele, evitando se aprofundar em fatores externos relacionados à pessoa. “Não é importante como o cliente é visto pelas outras pessoas ou que tenha recebido honrarias na vida, mas como ele é como indivíduo. Somos gente tratando com gente. A não ser que o projeto precise, por algum motivo, estar alinhado com estas conquistas públicas diante da sociedade. Aí faremos um trabalho para atender a esse objetivo”.
Equipe
Atualmente, o escritório de Emílio Caliman conta com sete integrantes, incluindo ele. Com a oportunidade de absorver uma demanda de estagiários em fase de formação acadêmica no formato remoto, reúne estudantes de Viçosa, Petrópolis e Vila Velha. “Conto também com os arquitetos Diego Garbelotto e Izabela Tonolli, que compõem a equipe”.
Emílio ressalta que mesmo com as comodidades do trabalho remoto, ele considera o formato presencial ainda a melhor forma de atuar. “Em situações mais extremas a gente consegue se adaptar. Mas tanto estar presente, como ter um espaço físico que nos acomode, que gera uma relação com o local, é mais positivo”.
Emílio gosta de sintonia e diz que formar equipe não é uma tarefa simples, mas que o agrada muito, pois gosta muito de lidar com pessoas. “Outro fator que considero fundamental é gerar oportunidades. Quando abro o escritório para mais pessoas trabalharem, tenho a chance de troca de conhecimento e estou viabilizando o desenvolvimento para outros profissionais. É uma maneira de ofertar algo para comunidade além dos projetos”.
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Sede do escritório
“Estar em um local estimulante é sem dúvida um excelente exercício de pensar e que influencia a criatividade”.
Para Emílio Caliman, o ser humano está sempre sendo influenciados pelo ambiente onde está. Tanto pela funcionalidade do espaço, como pela estética que o circunda. “Por conta disto, foi fundamental para mim fazer a sede do escritório em um formato que também pudesse nos influenciar de algum modo. Penso que nós da arquitetura devemos sempre oferecer novas formas de interpretação do olhar e esta é uma de nossas funções na sociedade”.
Este projeto de reuso de uma granja antiga e então desativada, do qual ele denominou CaféArq 32, estará completando cinco anos em maio de 2022. “Juntamos nossas atividades e de laboratório de café, com Rafael Marques, e nos lançamos nessa jornada. É um projeto temporário, que estará chegando ao fim ao completar este quinto ano de existência.”.
Emílio explica que a este processo se dá o nome de 'Arquitetura Efêmera', justamente esta arquitetura que se baseia na temporalidade, algo passageiro e transitório. “Para mim sem dúvida foi o maior exercício de arquitetura e de vida que já tive a oportunidade de fazer”.
O próximo passo é a construção da nova sede do escritório. Emílio fica se questionando sobre qual será o DNA deste novo espaço. “Qual experiência vamos oferecer para os clientes? Qual ambiente vai abrigar a equipe, nossos trabalhos, nosso dia a dia? Enfim, levo todos estes questionamentos para o projeto da sede. Os mesmos que levo para os projetos dos clientes”.
Traços de uma cultura local e essa integração com a natureza
Certa vez, ao desenvolver um trabalho junto a um designer capixaba de renome e o dois terem alguns pontos divergentes na forma de pensar, Emílio escutou: "Você é muito literal". "Sim, eu sou", respondeu.
A experiência lhe rendeu uma das mensagens mais formidáveis que ele disse já ter recebido. “Até então eu não tinha percebido o quanto eu era literal na forma de perceber as coisas. Isso me fez ver qual caminho devo seguir para oferecer mais e melhor no meu serviço com esta característica literalmente minha”.
Emílio considera ainda que o outro traço o acompanha: o empirismo. “O empírico é aquilo que vem das experiências imediatas, daquilo que pode ser captado com as sensações do mundo externo. Logo, uma das minhas formas de interpretação estão na combinação de empírico e literal”.
Emílio fala isso, pois sabe que o processo de criação tem muito da subjetividade. “E estas características são uma variante que procuro trabalhar em muitos dos projetos aqui do escritório, justamente pelas conexões que tenho com a valorização dos traços da cultura, da paisagem, da integração dos espaços com a natureza”.
O escritório também faz projetos de outras maneiras. A questão é a combinação entre o que o cliente solicita e aquilo do qual podemos oferecer. “Contudo, quando o projeto solicita esta "pegada minha", então me aprofundo nas minhas vivências, valores e percepções para trazer à tona reflexões sobre isto. E quando estes fatores sintonizam com os clientes, obtemos resultados muito positivos”.
Desafios
Sob essa crença da real importância da troca entre cliente e arquiteto, Emílio reforça não ser adepto a uma ideia pronta e diz sempre partir do pressuposto de que não há uma ideia tão boa que não possa ser aprimorada até o momento de sua materialização. “Até a sua concretização, essa ideia precisa vencer muitas etapas e passar pelas mãos de muitas pessoas. E está aí a beleza da arquitetura: não é música de uma nota só e sim uma verdadeira sinfonia”.
Diante do desafio, um dos pontos fundamentais que Emílio procura tratar com seus clientes é que eles estejam conscientes das escolhas que estão sendo feitas. “Uma vez definido, comprado e feito, mudar é dispendioso. Então as ideias têm que ser amadurecidas da melhor maneira possível antes. E, ainda assim, têm coisas que escapam, pois, é regra da vida não ter controle de tudo. Mas é fundamental encarar tudo com gentileza, para focar nas soluções”.
Ainda há outros fatores entre a imaginação e a prática. Por esta razão, Emílio gosta também de oferecer experiências aos clientes. “Ao invés de simplesmente contratar um marmorista para fazer a bancada, por exemplo, gosto de levar o cliente até as fornecedoras de rochas. Lá eles conhecem uma parte do mundo que, na maioria das vezes, nem sabem que existe e os fazem visualizar melhor as limitações e as possibilidades”, exemplifica.
Demandas atuais
As principais demandas do escritório hoje são projetos residenciais e turísticos. No rol dos turísticos, Emílio tem se surpreendido com o resultado, a exemplo da Cervejaria Azzurra, na Rota do Lagarto, onde foi usado como o elemento principal a pedra engaiolada (gabião), o que criou uma expressão e identidade muito forte para o local. “Fizemos o recente projeto dos produtos Dona Martha, em Venda Nova, que foi montado em um contêiner. Embora seja uma loja pequena, notamos uma receptividade e a repercussão positiva que o projeto criou”.
Apesar de receber muitos feedbacks dos clientes dizendo o quanto a arquitetura tem agregado, sabemos que não é a responsável pelo sucesso das marcas. “Até mesmo porque o que mais me motiva fazer os projetos turísticos é saber do empenho e da dedicação das pessoas que trabalham nos bastidores para fazer o turismo acontecer. É por isto então que, quando somos convidados para um projeto comercial, vamos a fundo, para fazer dele o único”.
Outro carro chefe do escritório são os projetos de residências, principalmente em Venda Nova e Pedra Azul. “Foi uma opção atender somente na região. Contudo, temos recebido alguns convites para levar nosso trabalho para outros lugares do Brasil... Então, esta é uma demanda que estou avaliando para o ano de 2022”.