Rafa MARQUES leva laboratório até as propriedades
A FAF Coffees, que vende café para dez países, se vale de atendimento móvel para aumentar conexão com produtores
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O recibo do primeiro pagamento, no valor de R$ 100,00, pregado no painel de memórias de uma das salas do centro de prova de Rafael Marques Cota, em Venda Nova, é apenas uma pista de quanto ele começou cedo essa história de amor com o café. Ele, que tem título internacional de Q-Grader- o profissional que dá selo de qualidade aos cafés especiais-, entrou nesse universo quando tinha apenas 14 anos.
Rafael começou a atuar em um tempo que o produtor tinha que esperar o final do dia para ver no noticiário da televisão a cotação do café. “Hoje a cada segundo eles têm acesso às mudanças de preço, assim como a informações importantes sobre manejo e tratos culturais. O acesso à tecnologia e à informação representa a principal diferença entre a realidade do produtor de hoje em relação à da época em que comecei a atuar no setor”, diz ao comparar a atual da antiga realidade.
Os leilões virtuais, por exemplo, que oferecem aos produtores a chance de alcançar um grupo maior de compradores internacionais e, como resultado, potencialmente vender seu café por preços mais altos, começaram no final do século passado. Rafael se lembra de ter participado de um entre 2003/2004 usando tabela e Excel, enquanto em 2019 participou de um leilão com mais de 25 compradores, de dez diferentes nacionalidades.
Na verdade, Rafael faz parte do time de profissionais que contribuíram para a mudança nesse cenário ao possibilitar que os cafeicultores passassem a conhecer o potencial de sua produção, bem com a existência de um mercado disposto a pagar pela qualidade. “A cada dez cafés que chegavam à mesa de prova, só um era bom, com 78 pontos. Hoje, café com essa pontuação nem chega à mesa. De cada dez que provamos, um ou dois têm nota perto de 80. As notas entre 83 e 84 predominam, enquanto os acima de 85 são raros, por isso chamados de cafés de microlotes”.
Atualmente, sentado em seu escritório ou com o celular na palma de sua mão, Rafael se conecta com o mundo e comercializa os cafés de produtores da região com torrefadoras e cafeterias de diversos outros países. “Os cafés brasileiros ainda são bases de 'blends', mas já existem torrefadoras no mundo que estão trocando o café da Colômbia pelos cafés do Espírito Santo”, declarou nas vésperas de vender um lote para o espanhol Joaquin Parra, 33 anos, um dono de torrefação que foi três vezes campeão de torra naquele país. “A torrefadora dele está entre as três melhores do mundo”.
Joaquim está entre os compradores que vêm anualmente conhecer o produto que compra diretamente na fonte. “Ele traz exemplares dos cafés que comprou na safra anterior e nos pacotes constam os nomes dos produtores. É como se fosse um troféu que valida todo o nosso trabalho. Ver o nome do produtor em uma embalagem é uma grande preciosidade. É ouro!”
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Laboratório móvel
Ao mesmo tempo que está conectado com o mundo, Rafael está atento à sua relação direta com o cafeicultor, indo onde ele está, na sua comunidade. Com um laboratório de provas sobre rodas, ele leva tecnologia até os cafeicultores, visitando de três a quatro comunidades por semana. “Passamos o dia com os produtores, acompanhando a colheita, passando informação sobre o manejo e trocando experiências com as famílias produtoras”.
Dentro da van tem equipamentos compactos, uma cafeteria, torradores para torrar as amostras e um moinho profissional. Em busca dessas preciosidades em grãos, o veículo leva sua equipe responsável por fazer provas diante dos produtores, que passam a compreender melhor como funciona uma análise sensorial. “Não nos limitamos a buscar, mas sobretudo nos propomos a fazer parte desse processo que resulta em cafés especiais. Cada região tem o seu diferencial e precisamos aplicar as práticas de acordo com as peculiaridades de cada talhão (como terroir, altitude...), e ver o que funciona melhor.
Um futuro
Era dezembro de 2000, quando seu padrasto pediu a então Associação de Produtores de Café de Venda Nova- Pronova, que permitisse que ele tornasse um aprendiz. “Meu padrasto queria que eu aprendesse para eu poder ajuda-lo em seu sítio e Evair de Melo, provador da Pronova da época, precisava de um auxiliar”. Rafa se recorda que o citado primeiro pagamento veio dois anos depois e ele começou a fazer parte da rotina da Pronova arrumando mesa de prova, classificando e auferindo a umidade dos cafés, arrumando sacarias no armazém, dentre outras demandas.
Em 2002, Rafael começou a se envolver com a degustação, ajudando a fazer provas e avaliações. Em 2005, com a saída de outros dois degustadores (Débora Zandonade e Sávio Filete), e com a transformação da associação em cooperativa, ele passou a ser gerente de qualidade e gerente comercial. “A Pronova começou a fazer o reconhecimento do selo de fair trade (mercado justo) e eu fiquei responsável por esta parte de comercialização, selecionava os lotes e fazia as vendas. Nesse período começou a minha conexão com o mercado lá fora''.
Em 2008, com Evair já fora da Pronova em função de ter assumido a presidência do Incaper, Rafael fez sua primeira viagem para o exterior: foi participar de uma feira de café na Alemanha. “Foram anos intensos de 2006 a 2011, atuando na parte comercial e fazendo muitos cursos e treinamentos”, disse sobre seu período final de atuação junto à Cooperativa.
Os projetos profissionais do provador passaram pela experiência em manter um café, o Café do Rafa, passou pela sociedade da Prove Café (de 2011 a 2015) e, finalmente, pela prestação de serviço para a Camocin, em Pedra Azul, e um período no continente Africano, no sul da Tanzânia, onde trabalhou junto a um grupo de mulheres africanas com interesse de melhorar a qualidade local, Em 2017, quando retornou aos projetos particulares, montou em Venda Nova uma filial da Faf Coffees, cuja sede é em São Paulo.
Atualmente dono das filiais da Faf Coffees, Rafael gosta de desfrutar da qualidade de vida de uma cidade como Venda Nova ao mesmo tempo que se relaciona com o mundo todo. Essas conexões podem ser via online ou em viagens anuais que levam ele até os seus compradores. Com uma viagem de menos de duas horas, ele chega ao aeroporto e de lá alça voo para onde for um endereço interessante para o café da região. “Meu padrasto viu um futuro. E acredito que o que estou vivendo seja ainda além do que ele imaginou! ”