Experiência com fermentação amplia perfis sensoriais do conilon
A fazenda da família Venturim, no Norte do Estado, em parceria com o Lapc fez os primeiros experimentos com a safra de 2017
![]() |
Lucas e o irmão Isaac ladeiam o pai Bento no plantio de conilon da Fazenda São Domingos. |
Quando soube pelo Sebrae do trabalho de fermentação desenvolvido pelo Laboratório de Análise e Pesquisa em Café- Lapc, do Ifes campus Venda Nova, Lucas Venturim procurou Lucas Louzada Pereira (professor e coordenador dos projetos desenvolvidos pelo Lapc) e propôs o desafio de desenvolver o mesmo projeto com o café conilon colhido na propriedade de sua família, no Norte do Estado. Estimulado pelo mercado consumidor, Venturim estava atrás de uma prática que pudesse extrair e evidenciar os diferentes atributos do café produzido.
“Tínhamos feitos alguns testes de fermentação, mas de forma muito empírica. E o professor Lucas nos recebeu muito bem, apresentou o trabalho desenvolvido com o café arábica e eu propus fazer o mesmo com o café conilon”, recorda-se Venturim.
Lucas Venturim colocou a Fazenda São Domingos à disposição para um convênio com o Lapac do Ifes e fizeram o primeiro experimento na safra de 2017. “O resultado foi muito bom e, a partir daí, incorporamos essa tecnologia para usar no nosso processo. Em 2018 conseguimos um resultado espetacular na Semana Internacional do Café. Ficamos entre os três dos cinco melhores cafés”, recorda-se.
Tradicionalmente conhecido como um café para fazer um 'bland' com o arábica, o conilon surpreendeu ao se revelar como próprio (e sozinho) ser comercializado para bebidas finas ou gourmetizadas. Esse movimento começou pioneiramente pelas mãos do pai de Lucas Venturim, o Bento, que em suas andanças pelo país sempre levava um pacotinho de café em sua bagagem.
Ainda no mercado para compor com outros cafés, o conilon da família Venturim, com marca própria, é ofertado nas versões cereja descascado, exóticos e em microlotes para o mercado de finos. “Usar o café sozinho, 100% conilon, é uma coisa um pouco nova, até mes
mo porque não se produzia e são poucos que o fazem com qualidade suficiente para ser usado puro. Somente cerca de 2% do conilon são produzidos com apego à qualidade, assim como acontece com o arábica, com 25%”, observa Venturim.
Com uma safra que varia de um ano para o outro, como parte do ciclo de renovação, a Fazenda São Domingos tem lavouras em várias fases de produção: umas no ápice, outras só começando, outras na metade do ciclo e várias decaindo antes da renovação. “Temos um projeto de renovação para mudar o espaçamento e adensar um pouco mais. Como estamos focando em qualidade, a produtividade está em segundo plano, mas não perdida de vista”.
A propriedade conta com uma minitorrefação e quando começou com a marca própria, a família já vinha produzindo um café de excelente qualidade. “No processo que chamamos de cereja descascado, já tinha cinco, seis anos que produzíamos nesse sistema, que agrega qualidade ao café. Só que ao ter contato com o mercado, com baristas e torrefações, a gente viu que poderia ser feito mais. Ouvimos falar de café experimentado e pensamos ser uma ferramenta para ter um portfólio maior de café, pois as pessoas queriam provar essas microtorrefações. O público de café especial quer essa diversidade”, observa
Quando Lucas Venturim começou a ficar cara a cara com esse mercado, percebeu que oferecia um café com um único perfil sensorial. “Era um único processo, uma genética só, um microclima só... Era bom, as pessoas gostavam, mas sentiam falta de outras variáveis. Vimos na fermentação uma possibilidade”, disse Lucas sobre o ponto que o levou a procurar a parceria com o Laboratório do Ifes.
O trabalho que começou em 2017, estimulado pela proximidade com a ponta da cadeia do agronegócio café, gerou bons frutos. “Nosso café é muito diferente e estamos chamando atenção por isso. De três a quatro anos para cá percebemos uma evolução grande em relação à aceitação e a curiosidade das pessoas. Quando a gente fala de conilon especial, as pessoas já ouviram falar ou já conhecem alguém que provou. Já não está como antes e não tem a mesma resistência”.
E pensar que tudo isso começou pela persistência do patriarca Bento no início do ano 2000. “Nem era o café nosso, era de Dário Martineli, que produzia na região. Meu pai levava para outras regiões produtoras tradicionais, e muitas vezes oferecia para provar sem dizer de qual café se tratava. As pessoas provavam e gostavam e, quando sabiam o que era, riam e não acreditavam que um conilon poderia resultar numa bebida boa daquele jeito”.
Lucas gosta de observar como seu pai insistiu nesse processo. “Geralmente é a geração mais nova que influencia a mais antiga. Na nossa família foi diferente”. Lucas é filho de Bento, que é filho de Euzaudino, que é filho de Amadeu Venturim, o primeiro imigrante a se fixar no município de Venda Nova, onde comprou sua primeira fazenda e deu a ela o nome de Fazenda São Domingos. O nome se repetiu em uma fazenda comprada no Norte do Estado.
“A nossa família produz café desde 1882, quando o meu tataravó Amadeu Venturim chegou a Venda Nova, logo começou a cultivar e, de lá, passou de pai pra filho e nunca mais parou”. Lucas, os irmãos e alguns primos fazem parte da quinta geração produzindo café e está caminhando para a sexta, pelo menos no que depender do que está acontecendo na casa dele, que já envolve seu filho nas atividades.
Com esse envolvimento, Lucas Venturim acredita estar deixando esse trabalho mais bonito e mais próximo do consumidor final. “Antes havia uma dependência de terceiros e as pessoas não tinham ideia da origem do café que estava bebendo. Essa nova forma de produção e comercialização da linha dos cafés especiais aproxima o produtor do consumidor final. Muitos entram em contato direto com a gente: se informa no pacote do café ou vê a nossa participação em algum evento e quer saber mais sobre a produção, conhecer a fazenda, falar de suas impressões... Tudo isso motiva muito a gente trabalhar”, conclui.