Português (Brasil)

ESPECIAL MORADIA E CONSTRUÇÃO - A história do primeiro escritório de arquitetura e engenharia de Venda Nova

ESPECIAL MORADIA E CONSTRUÇÃO - A história do primeiro escritório de arquitetura e engenharia de Venda Nova

A força e o pioneirismo de Haydê, que foi precursora dos projetos duas décadas antes de abrir com seu filho, o engenheiro Luiz Feitosa Perim, um escritório que fez projetos completos e de reformas, além de legalizar loteamentos

Compartilhe este conteúdo:
Haydê comemorou com um almoço em família o aniversário de 92 anos, completos no
dia 19 de novembro. Foi um encontro emocionante de diferentes gerações:
ela tem 15 netos e aguarda a chegada do sexto bisneto.

 

Uma jovem senhora casada era perfil do que se conhecia como uma profissional mais próxima de uma arquiteta em meados da década de 60, na então vila de Venda Nova. Haydê Feitosa Perim, que na adolescência aperfeiçoou seus dotes de desenhistas no Colégio Cristo Rei, em Cachoeiro de Itapemirim, colocou seus dons a serviço da comunidade, desenhando 'plantas de casas' para os moradores da localidade.

As casas erguidas pelas famílias de imigrantes italianos tinham quase todas as mesmas disposições, com os quartos saindo todos na sala grande e central. Haydê se recorda desse seu ofício, que era estimulado pelas assinaturas de revistas que ganhava de seu esposo Olímpio Perim, nem sempre animado com as atividades que extrapolassem seus compromissos com o lar e com os filhos. Ela se casou em 1947, quando tinha apenas 17 anos.

Um bate papo com ela e com o seu filho Luiz, engenheiro civil por formação, traz recordações a partir da década de 50. A família, que estava entre as poucas que hospedava personalidades (religiosas, políticas e empresariais) que chegavam à cidade, recebeu os donos da companhia responsável pelas obras da BR 262. Eles faziam parte da família Mayer, que atuava como arquitetos na Bahia, e prometeram mandar um projeto arquitetônico de presente para Haydê e Olímpio.

A família recebeu o projeto no início da década de 60 e a casa foi construída com os tijolos feitos na olaria de Olímpio, que ficava em seu sítio na Providência, onde hoje é o loteamento que leva seu nome. A edificação foi um avanço para a época e até hoje surpreende pelos seus detalhes e distribuição das áreas social, de convivência, de trabalho e de descanso (íntima).

De acordo com os cálculos de Luiz, a casa foi construída ainda no início da década de 60. “Os arquitetos tinham vindo umas duas vezes em Venda Nova. A obra inaugurou o sistema de separar ambientes: área social, cozinha/ serviço e área de repouso, composta pelos quartos”. Haydê desenhou os móveis: em estante com uma espécie de barzinho, a mesa de peroba com um confortável banco inteiriço de canto e tamboretes estão entre as peças ainda em uso na casa.

Ela conta que fez uma parceria com Arvelino Brunelli, marceneiro que morava na Serra da Povoação em Castelo, e ele executou todos os seus projetos. Armários de cozinha modernos, com escorredores de pratos embutidos na parte superior à pia estão entre as soluções para melhor funcionalidade da casa. Suas experiências valiosas eram replicadas em várias residências novas erguidas na cidade.

Outra faceta de Haydê foi construir a primeira lareira de Venda Nova. A casa nova da família já estava erguida e ela queria construir uma lareira devido ao clima frio e por considerar que seria um ótimo benefício. Ela tanto insistiu que convenceu o marido a fazer o investimento e partiu para o Rio de Janeiro levando um construtor para ver de perto uma lareira pronta. Dona Haydê conta sorrindo que apesar de o marido ter sido resistente a muitas de suas ideias acabava cedendo e apoiando suas iniciativas.

 

O escritório

 

Em 1980, Luiz já era formado em engenharia e voltou de Brasília para o Espírito Santo para dar aula na Ufes. Enquanto sua vaga não era disponibilizada resolveu aproveitar o ano que ficaria parado e decidiu morar em Venda Nova, quando foi convidado para ser o secretário de Obras da Prefeitura de Conceição do Castelo, sob o governo de Benjamim Falchetto.

O filho, que sempre fora estimulado aos estudos pela mãe, resolveu apoiar o trabalho dela. Juntos, eles montaram o  “Atelier de Desenho”, conforme está escrito na caderneta de anotações do que foi o primeiro escritório de arquitetura e engenharia de Venda Nova. Haydê fazia a concepção dos projetos, Lúcia Altoé (que tinha o curso técnico de desenhista) era responsável em reproduzir os projetos em nanquim, Máximo Feitosa (irmão de Haydê) cuidava das burocracias e Luiz era o responsável técnico.

O escritório pioneiro, além de projetos completos de casas, fez de reforma e de capelas e regularizou três loteamentos (de Egídio Zandonade, José Altoé Sobrinho e Ângelo Pianissolla),  uma grande faceta para a época. Conforme recorda Luiz, Ozani Moura também deu suporte ao projeto, pois era topógrafo do DNER.

Luiz conta que a aprovação da Lei nº 6766 (do Governo Federal), surgiram uma série de exigências para se criar um loteamento. Com várias áreas urbanas consolidadas em Venda Nova- sendo que a maioria não tinha mais espaços para se construir praças ou outros tipos de áreas públicas e também já ocupadas com construções fora dos padrões exigidos-, ele (como secretário de Obras e também pelo seu espírito urbanista) organizou um levantamento e elaborou um documento que foi acatado pelo juiz, possibilitando que todos pudessem fazer a escritura.

Para viabilizar muitos projetos em Venda Nova, Luiz não cobrava para legaliza-los junto ao Crea, repassando apenas as taxas exigidas pelo órgão. “Muitas vezes o escritório desenhava as plantas existentes para fazer as ARTs e legalizar as obras. Tio Máximo também colaborava muito e na maioria das vezes o escritório apenas cobrava os custos para poder pagar a desenhista e as taxas exigidas. A maioria do trabalho foi voluntário”.

Essa época em que o escritório começou a influenciar mais efetivamente no modo de construir as casas em Venda Nova houve muita resistência em abandonar alguns costumes. As pessoas não gostavam de fazer casa com corredores, pois acreditavam que estariam perdendo espaço. “O hábito das famílias foram mudando. As pessoas não dormiam cedo, no mesmo horário, como antigamente, e ter uma ala só para os quartos passou a ser importante. Também conseguimos tirar o costume de construir banheiros saindo na cozinha, sob a alegação que passou a ser proibido. Foi um processo pedagógico”, recorda-se Luiz.

Luiz se lembra de um fato polêmico, quando o então pároco, o padre Emílio, fez campanha para renovar as igrejas, o que significou a demolição da Matriz da Sede de Venda Nova, a do Alto Caxixe e a de Bela Aurora. A igreja do distrito de São João caiu, por outros motivos. Preocupada, Haydê fez então o projeto para a da comunidade de Bela Aurora.

Tanto Haydê quanto Luiz sempre foram a favor da preservação do patrimônio arquitetônico, que na época não era visto assim pela maioria da população e nem pelas lideranças. Mãe e filho ajudaram a preparar os projetos de várias igrejas (cuja as antigas foram derrubadas) e compraram e desmontaram uma antiga casa antiga, a reerguendo no bairro Vila da Mata. Outro exemplo desse patrimônio é o restaurante do Alpes Hotel.

Compartilhe este conteúdo: