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A arquitetura na gastronomia

A arquitetura na gastronomia

* Por Emílio Caliman Terra

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Casa de Giuseppe Falchetto e Luigia Bufo, no Pé da Serra, em Lavrinhas.

Por falar em gastronomia e em arquitetura, convido para continuarmos este papo no melhor lugar da casa: a cozinha. Então. Vamos lá pra fora?

Sim, é isto mesmo. A cozinha na casa do imigrante italiano, em sua maioria, era posicionada fora do corpo principal da casa (onde ficavam os dormitórios e a sala). A cozinha poderia configurar tanto uma edificação à parte, ligada à casa através de uma passagem coberta e semi-aberta, como também uma extensão do corpo da casa (parede com parede), porém sempre um elemento extra no conjunto da construção. A propósito, essa característica de implantação da cozinha, segundo registros bibliográficos, é considerada uma adaptação local, uma vez que se difere da concepção rural Norte Italiana das moradias. Uma das possibilidades para tal modelo, pode ser o fato de a cozinha ter sido vista como uma construção destinada a serviços, como as demais edículas organizadas pelo sítio, cada qual com sua função: armazenamento (paiol, tulha, etc), moinho, galinheiro, pocilga, entre outras.

Eventualmente, a cozinha era acompanhada de mais um cômodo, onde se armazenava basicamente os alimentos e utensílios, é neste depósito que devíamos encontrar aquela lata dos biscoitos que a mamma preparava para as visitas, a carne em conserva na banha de porco, ou então, onde se pendurava o socol e as linguiças que não estavam defumando sobre o fogão, enfim, talvez até a caixinha que a nonna guardava seu escasso trocado de dinheiro ficaria escondido em um canto deste cômodo.

O forno, assim como a cozinha, era
independente das demais construções.

Mas, e quando não existia o depósito? Se acumulava tudo na cozinha mesmo! O fogão, de fato, o centro das atenções, era onde vez por outra, uns e outros aprochegavam para se aquecer das manhãs geladas enquanto tomava um gole de café com leite. Era nele também que diariamente se fazia borbulhar a polenta de dentro do ‘panelão’ que iria alimentar os muitos integrantes da família, ou preparar o alimento que seria levado para os que estavam lá na roça. Compunham este cenário ainda a mesa e bancos de madeira, estantes, utensílios pendurados, panelas, latas, potes, travessas, chaleira com água fervendo, coador de café, caixote de lenha e lenha estralando, fogo aceso, balde, leite, queijo, quadro da sagrada família na parede, vela acesa para os momentos de oração, e um pouco mais de prosa, a propósito, nessa prosa tão boa, vou deixar que o pensamento e imaginação dos leitores continuem a compor e/ou reviver os detalhes deste local, que abrigou principalmente a fortaleza das mulheres,  e muito alimentou a vida e a fé das famílias de nossos antepassados.

Assim como no casarão acima, percebe-se na moradia antiga dos saudosos Jovelina Breda
e Silvino Falqueto como as cozinhas eram erguidas fora do corpo principal da casa.

Voltando para arquitetura, se é que saímos dela, diga-se de passagem, não poderíamos deixar de recordar de outro elemento marcante nas construções dos imigrantes: a  presença do forno. Este forno como a cozinha, era localizado independente das demais construções, sendo feita uma cobertura para ele. Segundo consta na literatura da arquitetura da Imigração Italiana, o forno é uma referência direta das residências tradicionais do Norte da Itália, e foi fielmente replicado aqui no Brasil. Além do forno, nas proximidades da cozinha, existia também o tanque que servia de apoio às atividades de limpeza e captação de água. Este tanque era de água corrente captada do córrego mais próximo, já que as moradias estavam sempre na proximidade de um curso d´água.

Enfim, essa prosa teria ainda muito o que se arrastar, mas não poderíamos terminá-la sem ressaltar que da simplicidade, nossos antepassados construíram histórias de grande valor, seja pela cultura, gastronomia e pela arquitetura, muitos dessas referências são mais presentes no nosso dia a dia do que imaginamos, assim, olhar para elas com atenção, é sim uma fonte valiosa!

Emílio Caliman Terra. Arquiteto formado pela Ufes.

 

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