FAMÍLIA SOSSAI - "De porta em porta, de parto em parto: nos passos de uma parteira’’
Pela neta Laís Moreto Caliman
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“Nos idos de 1917 nasceu Maria Sossai. No dia 08 de dezembro, a nossa “vovó Maria”, em Venda Nova, filha de Jerônimo Sossai e Anna Carolina Minet, imigrantes italianos da região do Vêneto, ao norte da Itália, que se casaram no Brasil. A vovó Maria foi criada em uma família numerosa e unida, um legado dos nossos antepassados italianos que se perpetuou na maioria das famílias daquela época. Sendo a oitava filha de um total de doze irmãos, com os quais manteve-se durante toda sua infância e adolescência.
Na sua mocidade foi cortejada por dois rapazes, entre eles Elizeu Caliman, um jovem vistoso e elegante, que tomou a iniciativa de acompanhá-la, após a missa dominical, até sua casa, jogando seu charme de tal forma que a encantou.
Elizeu era filho de Ângelo Caliman e Carolina Camatta, também imigrantes oriundos da mesma região dos pais da vovó Maria e em outra numerosa família de treze outros irmãos; nasceu em Venda Nova no dia 15 de agosto de 1915.
O amor entre eles floresceu e juntos, construíram uma família com doze filhos. À medida em que a família crescia, eram delegadas aos filhos suas responsabilidades. Alguns saíram cedo para estudar, outros se casaram, e alguns ficaram no sítio ajudando com as tarefas na propriedade.
Vovó Maria era uma mulher guerreira, trabalhadora e que não conhecia “tempo ruim”. Dava conta de seus filhos, trabalhava na roça e delegava entre suas filhas os serviços da casa, estes que, segundo relatos, não eram muito apreciados por ela, uma vez que preferia trabalhar na lavoura, cuidar da criação, da horta, etc.
Habilidosa e ativa, ela se destacava na cozinha com pães, bolos, roscas, doces de compota e marmeladas. Também costurava e bordava, especialmente em dias chuvosos, transmitindo essas habilidades para algumas de suas filhas.
Mulher de fé, diariamente juntava toda a família para rezar o terço, exceto aos domingos, quando iam à missa.
Mas ainda não é sobre isso que quero falar. A Vovó Maria era conhecida nas proximidades por ser parteira. Na época, pela escassez de serviços de saúde e levando em conta toda a dificuldade existente, surgiu a oportunidade de fazer um curso de parteiras em Castelo, cidade da qual Venda Nova era distrito. Curso este que ela e outras três senhoras de Venda Nova se dispuseram a fazer. Não era um trabalho, era uma missão. O desejo ardente e genuíno do coração dela em ajudar outras pessoas era para cumprir seu propósito de vida. Com apoio do vovô Elizeu, ela saía independente da hora, fosse dia ou noite, ou mesmo no despertar abrupto de um sono em meio à madrugada, pegava sua maleta e partia, sem hora para voltar. Não havia distância, chuva ou sol que a impedisse de realizar sua tarefa.
Certa vez, logo após o pôr do sol, chegaram em sua casa dois cavaleiros desconhecidos por ela. Um montava seu próprio cavalo, enquanto o outro trazia um cavalo para Maria montar e a chamaram para fazer um parto com urgência. Embora não tivesse familiaridade com os indivíduos, ela tinha conhecimento da senhora mencionada pelos cavaleiros.
Sem hesitar, ela se despediu do vovô e prosseguiu no seu trajeto durante a noite.
A estrada era difícil, cheia de pedras e perigos, mas ela seguiu sem medo, confiando somente na palavra deles e nos cuidados de Deus sobre sua vida. Vovó era muito devota a Nossa Senhora, a quem recorria em suas orações antes, durante e depois de realizar os partos. Passou a madrugada e retornou à tarde, no dia seguinte.
Enquanto isso, o vovô sempre preocupado e sem notícias, esperava o retorno de Maria para casa.
Na ausência da vovó, o vovô Elizeu assumia os cuidados da casa e delegava tarefas às filhas mais velhas. Ao final, dava tudo certo. Sempre deu tudo certo.
Diante de tantas histórias desafiadoras e emocionantes, foram registrados em sua caderneta mais de duzentos partos, mais de duzentas histórias que com muita satisfação ela se alegrava de ter feito parte.
A vovó Maria e o vovô Elizeu faleceram em 06 de dezembro de 2013 e 08 de dezembro de 2012, respectivamente; e tiveram doze filhos, dos quais onze ainda vivos até a edição desta publicação.
São eles Nair, Zenaide, Siegilde, Sérgio, Carolina(?), José, Eulália, Marta, Ivan, Saulo, Luciano e Lucinéia.
Desses filhos foram gerados 12 netos, 18 netas, 15 bisnetos, 20 bisnetas e duas trinetas.
Deixaram um legado de fé, esperança e caridade que, somados a muito trabalho e amor à família, deram frutos doces e genuínos de uma terra fértil e acolhedora que até os dias atuais prosseguem em generosa abundância e sob as bênçãos de Deus.
E nós ficamos com as lembranças de uma mulher de garra e força indescritíveis, nos inspirando com suas histórias lindas e com seu coração generoso.
Essa é uma página do livro da vida de vovó Maria que tive o privilégio de escrever”.