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75 anos do Rio Branco: As famílias seguraram os jogadores no lugar

75 anos do Rio Branco: As famílias seguraram os jogadores no lugar

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Na juventude Zeca Altoé alimentou o sonho de jogar em um grande clube. Ele e outros veteranos receberam
convites, mas se viram obrigados a ficar com a família para trabalhar na lavoura.

Como já foi dito, vários jogadores do Rio Branco receberam propostas para atuar fora de Venda Nova. A obediência aos pais e o compromisso com a família os mantiveram no lugar, embora o sonho e a paixão pelo futebol os acompanhem até hoje.

Este também é o caso de Zeca Altoé, 84 anos, considerado um fenômeno no futebol de sua época. Esses homens fortes, ágeis e dedicados mal tinham tempo de treinar e, em sua maioria, atuaram em média três décadas dentro de campo.

Aos 12 anos de idade, quando voltou do colégio religioso, Zeca começou assistir os primos jogarem. Com 13 anos já integrava o time. Antes, porém, ainda muito menino (com 9/10 anos) costumava cobrir a falta de alguns, quando deixava os demais jogadores bravos pela sua facilidade de tirar a bola dos pés deles. “Eu era esperto”. Zeca também era valente, atributo que desenvolveu pela ausência da mãe, que perdera aos sete anos. “Eu tinha que defender meus irmãos”.

Zeca tinha talento para jogar em todas as posições, menos na de goleiro, como ele mesmo admite. “Eu era doutor mesmo na lateral esquerda e jogava com os dois pés. Eu jogava por prazer e na época não era toda família que deixava os filhos jogarem devido ao medo de se machucarem. Quando acontecia comigo eu ia mancando mesmo para a roça, mas não deixava de trabalhar”.

Numa ocasião de destino limitado, Zeca alimentava o sonho de ser jogador de um grande clube. Certa vez, quando o time de Castelo veio jogar em Venda Nova anunciou que traria um profissional, que passava uns dias por lá. “Eu não conseguia dormir nas noites anteriores imaginando que ele iria colocar o Rio Branco no bolso. Então tive a ideia de instruir meu irmão Pedro a marcar o jogador que, ao sair da marcação, eu estaria de prontidão para pegar a bola. A estratégia deu certo: não deixamos ele nos anular e no final do jogo ele ainda me convidou para atuar no Rio de Janeiro, pois ele fora instruído a reconhecer novos talentos. Eu fiquei doido e fui falar com meu pai que respondeu: ou padre ou roça”.

Diante da negativa do pai, Zeca colocou na cabeça que servir o Exército seria sua grande chance, pois alguém o veria atuando no time. “Se alguém me chamar para jogar eu não volto”, pensava na época. No dia dele se apresentar, o pai o acompanhou e mesmo antes de chegar sua vez na fila, o general o dispensou falando que seus problemas graves de saúde impossibilitavam seu ingresso. “Você está doente, não serve”, recorda-se das palavras. “Eu sabia que o Exército tinha time e meu pai percebeu minhas intenções, interferindo para que eu não fosse admitido”.

Na verdade, Zeca tinha muita raça e saúde. Para acalentá-lo o pai lhe deu um dinheiro para ele passear no Paraná, na casa de seus parentes, onde também bateu uma bola. No retorno foi conhecer o Rio de Janeiro e aproveitou para ver um jogo no Maracanã. “Fiquei tão empolgado que esqueci que estava no mundo. Foi o presente mais bonito que eu tive em minha vida. Jogavam o Vasco, meu time, e Bom Sucesso. Olhando eles jogarem, eu falei: boto todos no bolso. Aí que fiquei mais doido ainda”.

“Eu voltei para casa mais doido ainda pelo futebol. Mas não existia a possibilidade de eu desobedecer meu pai. O que meu pai falava era lei. Eu aceitei. Sofri, mas entendi que ele precisava da gente”.

Zeca faz coro aos ex-jogadores que reconhecem Olímpio Perim como uma figura importante para o futebol do Rio Branco. “Era um pai para nós. Ele se dedicou de verdade, embora não jogasse pelo problema que tinha na perna. Foi um dos maiores benfeitores do Rio Branco e isso não pode ser esquecido nunca”.

Quando Zeca começou a namorar (sua primeira esposa, que morava próximo a Castelo, na comunidade se chamava Macaco na época), ele organizava suas idas à casa da amada de acordo com o calendário dos jogos. Certa vez, uma mudança fez coincidir as datas e, como ele fazia apenas uma visita por mês, disse que o time teria que jogar sem ele. “O jogo era importante, contra o São João de Viçosa: era como se fosse um clássico do Vasco e Flamengo”.

Diante da decisão de Zeca, Olímpio Perim lhe propôs manter a visita e disse que o buscaria na manhã de domingo. “Você vai lá que eu estarei às 8 horas de domingo para lhe trazer”. E assim o fez. O resultado do jogo foi de 2 a 1 para o São João de Viçosa. “Eu fiz um gol contra só para não deixar o Nilo Bragato fazer o gol. Preferi fazer contra do que deixar ele marcar”, disse rindo da situação. 

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