75 anos do Rio Branco - Eles pagavam para jogar
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Eudes Perim está entre os craques veteranos. Ele é filho de Ricardo Perim, que segundo ele,
trouxe a primeira bola de futebol para Venda Nova.
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Eudes Perim vai completar 81 anos em agosto. Outro apaixonado por futebol. Ele começou a jogar aos 13 anos, quando voltou dos estudos em colégio religioso interno no Rio de Janeiro. Aos 16 anos era titular no Rio Branco, jogando como meio esquerda e também com experiência em todas as posições dentro de campo. Ele não era um dos grandões, mas era esperto e ligeiro e emprestou seu talento e energia ao Clube até os 40 anos de idade.
“Eu não tinha coragem de dar pancada e só jogava na bola mesmo”. Ele, que atuou durante 26 anos, se recorda que no início tinha de arcar com todas as suas despesas: chuteira, meiões e todos os materiais necessários. O time só tinha jogos de camisa para as disputas oficiais (do Fluminense para o principal e do São Paulo, para o secundário).
O primeiro uniforme que Eudes usou era composto por uma bermuda de brim branco bem comprida e com boca apertada. No caso dele, chegava até os joelhos. De acordo com descrições dele, as laterais das bermudas eram mais largas, com tecido duplo e com várias costuras, formava uma espécie de proteção, como acreditavam na época.
Nessa época o campo era desprovido de qualquer estrutura, só contando com uma cerca de arame. “Muitas vezes, antes dos jogos, nós arrancávamos as vassouras em meio ao gramado. De vez em quando, íamos cuidar do campo nas tardes de sábado”.
Quando o time entrou no campeonato intermunicipal, foi preciso cercar o campo. De acordo com Eudes, Clínio Zandonade doou a ma-deira e seu pai, Ricardo Perim, emprestou o seu carro para ele buscar e levar a madeira à serraria de Deolindo Perim para fazer as peças do alambrado. Só foi cercada a parte da frente do campo. Todo o trabalho foi feito à noite. Tirso Altoé, Eudes e Altino Zulcão fincaram os esteios e pregaram o alambrado. Altino era massagista e ajudava o Clube em várias ações em busca de melhorias.
Com atuação prestigiada em Venda Nova, o time do Rio Branco fazia muito intercâmbio com times de outros municípios da região, com jogos até em Marilândia, no Norte do Estado. Eles iam tão longe em razão do parentesco com os moradores de lá, a maioria famílias oriundas de Venda Nova. “Íamos em cima das carrocerias de caminhão. Jogávamos no sábado e no domingo e retornávamos na segunda. Quase todos os anos tinha uma excursão para lá. Eles vinham aqui também”.
A maioria dos jogos era em casa, no distrito de São João e nos campos dos municípios vizinhos. “Quando ia ao Patrimônio do Ouro ou em Fruteira, por exemplo, eu gostava quando a comunidade ia nos recepcionar. Só tinha uma praça iluminada e eles ficavam ali nos esperando”.
Com as viagens feitas em carrocerias de caminhão, sofrer com o frio era certeiro, principalmente no retorno. Quem tinha capa gaúcha levava e muitas vezes a peça servia de abrigo para dois ou três jogadores. Todos se embolavam e bebiam um pouco para enfrentar o frio. “Uma vez, Olímpio saiu da boleia e foi ficar com a gente, no frio, bebendo e cantando”.
Em uma dessas viagens, os jogadores só conseguiram chegar de madrugada em casa, sob um frio intenso. “Era um campeonato intermunicipal e fomos num lugar chamado Anutiba, depois de Iúna. Foi um dos lugares mais longe que fomos na região e passamos muito frio na volta. Mesmo assim, era muito divertido”, recorda-se Eudes. Todas essas adversidades eram enfrentadas pelos jogadores que pagavam mensalidade para atuar. “Era para comprar uniforme, bola... “, justifica.
Ele se recorda que os embates com o time do distrito de São João de Viçosa estavam entre os mais intensos e disputados. “Honório Pizzol trazia jogadores de fora e os empregava no armazém. Eles treinavam e formavam um time excelente. “Teve um dia que ganhamos e voltamos de lá a pé, fazendo bagunça pela estrada. Era muito animado. Jogávamos pelo esporte, pela diversão, sem qualquer outro interesse”.
E esse talento pelo futebol chamava a atenção de quem passava por aqui. Da varando de Roberto Feitosa, o hóspede Eliezer Batista era um dos que se encantavam com o time. O então presidente da Vale do Rio Doce assistia ao jogo confortavelmente sentado e na companhia do amigo e anfitrião. Eliezer chegou a propor a Eudes atuar na Desportiva Ferroviária (em Cariacica), garantindo emprego na Vale e continuidade nos estudos. O pai de Eudes não deixou.
Jorge Abib, professor em Castelo, também propôs oportunidade ao jogador de atuar no time de lá e também estudar. Para tentar amolecer o patriarca, levou Eudes para passar uma semana jogando nas Olimpíadas de Friburgo, Rio de Janeiro. Não teve sucesso, pois o pai precisava e queria o filho por perto.
Voltando à atuação no campo do Rio Branco, o time se manteve durante muitos anos com o apoio de Olímpio Perim, que atuava também como técnico, embora sem experiência. Como não podia jogar devido a um problema na perna, fazia de tudo para apoiar. As reuniões com os jogadores dentro da sua venda (a velha), quando ficava atrás do balcão e a turma toda amontoada. Era a reunião do time e não tinha outro lugar para esse fim. Não tinha sede, não tinha uma sala sequer. Olímpio gostava muito do time. Muitas vezes comprava os uniformes e o Rio Branco pagava como e quando pudesse”.